terça-feira, 27 de novembro de 2018

A segunda parte do show

Quando completei 40 anos, não tive crise de meia-idade, mas passei a ter consciência da minha própria mortalidade. Partindo do pressuposto de que viverei razoavelmente bem até os 80 (e aí partir estarei pronta para embarcar no programa de eutanásia mais próximo se a saúde falhar), agora estou na segunda e última parte da minha vida - sem esquecer que nessa fase o tempo parece passar cada vez mais rápido.

Tenho lido livros e artigos sobre maturidade e velhice. Ainda me sinto bem jovem, até porque meus colegas de concurso são bem novinhos e tenho convivido muito com eles, mas gosto de saber o que vem pela frente. Muita informação não é novidade: é importante se manter ativa, evitar excessos, cultivar amizades, dormir bem. Outros dados são inesperados: pesquisas mostram que a felicidade da maioria das pessoas cai entre 20 e 40 anos, e começa a subir de novo aos 50. Tem a ver com o estresse de se estabelecer economicamente, construir um patrimônio e cuidar dos filhos, que só se tornam independentes após a adolescência.

Como não tenho filhos, não estou nem um pouco estressada (e talvez minha felicidade após os 50 não aumente tanto, já que também não terei netos). Mas acredito que, se não tivesse mudado de emprego, estaria reavaliando minhas escolhas. É isso que quero? Meu trabalho tem significado? Fico feliz com a ideia de seguir essa carreira por mais 20 anos? (Quando comecei a trabalhar, a perspectiva era me aposentar aos 55, mas acho que não vai rolar. Estou contando com uns 65.)

Acho que a vantagem de ficar mais velha é ficar mais pé no chão. Não dá mais tempo de virar astronauta ou estrela de Hollywood. Os limites ficam mais claros.

As possibilidades também.

domingo, 25 de novembro de 2018

Pra cá e pra lá (com muita ou pouca bagagem)

Uma das maneiras mais fáceis e recompensadoras de embarcar no minimalismo é imediatamente antes de uma mudança. Se for para um lugar menor, melhor ainda. Fazer uma seleção do que realmente importa não só facilita o transporte dos objetos como a mudança de cenário faz com que você nem sinta a falta deles. Casa nova, vida nova!

Logo, imaginei que pessoas para as quais a mudança de endereço é um estilo de vida (isto é, meus colegas de trabalho) seriam craques nisso. Se de tantos em tantos anos você tem de empacotar tudo e partir para um destino totalmente diferente, não é prático carregar pouca coisa? Tanto para não se preocupar com atrasos na mudança e com danos nos móveis como para ter espaço, na casa e na alma, para novos hábitos e estilos de vida. Móveis de varanda não serão muito usados na Sibéria. Equipamento de esqui vai ficar encostado na Índia. Eletro-eletrônicos provavelmente vão exigir tomadas e voltagens diferentes. E por aí vai.

Perguntei a uma colega que cuidava de transporte de bagagem se os contêineres da galera iam ficando menores à medida em que a carreira progredia. Para minha surpresa, ela disse que não. Ao contrário: quanto mais anos de trabalho, mais coisa a pessoa juntava.

Fiquei sem entender até que, um dia, tive um insight: se a pessoa está cada par de anos em um país, ter em torno de si objetos familiares pode dar um sentido de continuidade e segurança. Principalmente para cônjuge e filhos, porque o servidor do serviço exterior tem pelo menos sua carreira para se agarrar psicologicamente. O acompanhante tem de se virar para (re)encontrar sua identidade a cada novo posto.

Dito isso, acho que existe uma grande distância entre possuir apenas 50 objetos e acumular pilhas de bens. Imagino que seja muito fácil adquirir obras de arte, artesanato, louça, roupa e equipamentos toda vez que a pessoa se instala em um território diferente. Tanta novidade! Tudo tão bonito e colorido! Mas imaginem o trabalho e a dor de cabeça a cada realocação.

É verdade que, de 2013 a 2015, ficamos sem casa por 26 meses, então eu não podia juntar coisas, ponto. Minha próxima mudança vai ser diferente: iremos para um lugar fixo onde ficaremos por pelo menos dois anos. Ou seja, vai ser possível (e até fácil!) me deixar seduzir pelo consumo e pela acumulação.

Mas acho que não vai acontecer, viu? Voltamos para Brasília e mantivemos nosso estilo de vida simples e desapegado. Pensamos seriamente em, quando formos removidos, alugarmos um apartamento mobiliado e levarmos pouquíssima coisa do Brasil.

Só paçoquinhas e cachaça.

sábado, 24 de novembro de 2018

Bodas de prata

Eu e Leo fizemos 25 anos de namoro + casamento em maio deste ano. Continuamos um casal fofinho, que sente saudades um do outro se passa um dia sem se ver (desculpaê).

Uma amiga perguntou qual era o segredo do sucesso e eu, após matutar um tanto, respondi: encontrar a pessoa certa. E como você encontra a pessoa certa?, ela indagou. Bem, no meu caso ele bateu na minha porta, confessei (é verdade: o Leo foi colega de faculdade da irmã mais velha e foi fazer um trabalho em grupo na minha casa).

Ela disse que eu estava de sacanagem, mas juro que eu não estou escondendo o ouro. O Leo é a pessoa certa para mim, e eu a pessoa certa para ele. Começamos a namorar cedo (eu tinha 17!) e fomos crescendo na mesma direção (em vez de cada um pra um lado, o que às vezes acontece). E ainda demos a sorte de casar e ir morar longe das famílias - elas são ótimas, mas aprendemos a contar 100% um com o outro, já que não dava para ter uma discussãozinha e dizer que ia dormir na casa da mamãe.

Outra coisa que funcionou pra gente foi não ter filhos. Sei que muita gente tem e os ama muitíssimo, mas não dá para negar que eles são fonte de preocupação e stress (e orgulho, e alegria, e realização também). Abrir mão de crianças nos deixa livres, leves e soltos para ter uma vida de luxo e ostentação (viajar a qualquer hora, almoçar brigadeiro, mudar de carreira, não ter carro) e dar toda nossa atenção um ao outro. De um de nós morrer cedo, o que ficar está lascado? Está. Mas resolvemos correr o risco #vidaloka.

Então, acho que basicamente demos uma sorte danada.

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Aula de russo (ou de humildade)

Como estava em missão, perdi as 3 primeiras aulas do curso de russo básico. Estudei o alfabeto cirílico por conta própria e cheguei toda pimpona, crente que ia abafar.

Só que não. Aprendi (mais ou menos) o alfabeto cirílico em letra de forma, e a professora só usa cursiva. Passo metade da aula tentando decifrar que diabos está escrito no quadro-negro, e a outra metade anotando desesperadamente o som das palavras que ela fala. Chega uma hora que basicamente ergo os braços para o céu e desisto de ambas as coisas. Enquanto isso, a professora começa a ensinar conjugações (!!!).

Para completar, um dos colegas leva muito jeito e/ou já estudou russo antes, ou seja, responde todas as perguntas da professora enquanto eu arregalo os olhos. Reclamei com o Leo que o moço makes the rest of us look bad, e o Leo riu. E acrescentou: "bem-vinda a como a maioria de nós se sente."

Confesso que costumo ser a queridinha do professor nas aulas de línguas. Gosto de idiomas e sou caxias, então faço os exercícios, pratico em casa, entrego as redações. Aí acabo me saindo melhor do que alunos que têm menos interesse. Mas, nesse curso, nem dever de casa tem! Vocês podem imaginar a minha frustração.

Outro colega também perdeu o começo do curso. Ele foi a uma aula e depois não apareceu mais. Pelo jeito percebeu que ia ser muito sofrimento.

E é. Sinto vontade de desistir também? Sinto. Mas cheguei à conclusão de que continuar frequentando as aulas vai ser bom para mim. Além de aprender um pouquinho de russo (mais do que aprenderia se não fosse!), espero introjetar o fato de que não ser uma das melhores alunas da sala não mata ninguém.

Só de raiva.

domingo, 4 de novembro de 2018

De volta!

Nem acredito que estou de volta à minha casinha!

Ficamos muito bem instalados em Munique (o chão do banheiro era aquecido; a luz do hall,  automática; a roupa de cama, deliciosa). Ou seja, não senti falta do nosso apartamento. Mas uma casa montada pela gente, com tudo que precisamos e gostamos, é outro nível de conforto, né?

O período na Alemanha foi ótimo. Tão bom que me reconciliei com o país: se aparecer Berlim, Frankfurt ou Munique no meu futuro, irei bem contente. Só não vai mais para o alto da lista porque a língua não é mais fáceis. Aliás, tomei um pito (em inglês) de uma senhora no ônibus por não falar alemão: segundo ela, já que eu ia ficar dois meses por lá, tinha que ter me virado e aprendido alguma coisa. Respondi que ela tinha razão. Meu ponto chegou e eu desci, sem ter tido a oportunidade de explicar que eu gostaria de ter estudado um pouquinho, sim, mas que o trabalho não deixou.

Entre bretzels, cerveja, sorvete e chocolate, a dieta low-carb foi para o espaço, sem o menor drama. Agora estou avaliando se vale a pena voltar para ela. Ganhei de volta os 2 quilinhos e pouco que eu tinha perdido, mas também lembrei como carboidratos são gostosos. E como não é questão de saúde, mas de vaidade mesmo, talvez ela fique guardada para quando as roupas de trabalho ameaçarem não caber mais de novo.

Estou animadíssima para voltar ao trabalho, encontrar os amigos, contar as novidades, distribuir chocolates. E terça-feira tenho aula de russo! O alemão não deu certo, o espanhol também não, mas acho que agora vai.