quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O Caso da Energia

Pensei uma coisa aqui: e se, historicamente, esse excesso de regras e modelos aplicados à mulher (tanto quanto ao comportamento quanto à aparência) não é também uma maneira de canalizar a energia e a criatividade que as mulheres, como todos os seres humanos, têm em quantidades consideráveis, para atividades pouco construtivas e nada revolucionárias?

Falo por mim. De como eu estava usando minha curiosidade e minha memória para estocar um grande número de conhecimentos sobre celebridades, moda e maquiagem. E de como eu os usava para ficar muito chique, muito bela e muito atualizada, e de que como isso não me servia pra absolutamente nada, a não ser para receber alguns elogios a respeito de como eu me vestia bem.

Poxa, é isso que eu quero no meu epitáfio? “Ela se vestia bem”? (Não que eu vá ter um epitáfio: prefiro ser cremada, obrigada, e se eu morrer lá longe não precisa repatriar meu corpo nem nada. Se quiserem se lembrar de mim é só folhear minhas pilhas de livros com manchas de chocolate nas páginas.)

Não estou dizendo que eu não me sentia “bem” com tudo isso. Que eu não adorava chegar a uma festa e me achar uma das convidadas mais elegantes de todas (não quer dizer que eu fosse, tá? Mas achava.) O que estou questionando é o trabalho danado que dava para eu me sentir “bem”. E como era um sentimento volátil, porque era só aparecer uma espinha na testa ou um pneuzinho na cintura para ele ir embora.

Aí eu não consigo deixar de pensar nos montes de blogues sobre moda/maquiagem/celebridades. Que eu já gostei muito de freqüentar mas que, hoje em dia, me cansam. Acho que as pessoas que fazem esses blogues são capazes, dedicadas, inteligentes, cheias de idéias, tudo de bom. E não consigo deixar de achar que todas essas ótimas qualidades podiam estar sendo usadas, sei lá, de tantas outras maneiras. De um jeito mais contestador, mais questionador, menos status quo.

Eu sei, eu sei, é diversão, e da diversão só se exige que entretenha. Mas fico desconfiada que muito poder cerebral está sendo canalizado para atividades pouco construtivas e nada revolucionárias.

21 comentários:

  1. Minha resposta pro seu primeiro paragrafo. Sim, logico!

    Mas isso nao se aplica so as mulheres: esse eh um video da "love police" - http://www.youtube.com/watch?v=rX7lOk2H8eo - os malucos do video querem mostrar que uma sociedade obcecada com consumo e em panico de terrorismo e doencas eh uma sociedade muito mais facil de manipular.

    Qualquer semelhanca com o que voce falou ai no seu post nao eh coincidencia.

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  2. É, Lud, eu sempre penso nisso. Aí quando expresso esse tipo de dúvida recebo outra pergunta de volta: "mas a gente tem que ser construtiva e revolucionária em tudo?". Eu acho que SIM. Mesmo na hora da diversão puramente desmiolada e inútil, dá pra fazer isso em pequenas coisas.

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  3. Oi, Ludmila!
    Frequento seu blog há pouco tempo e gosto muito.
    Acho que não é só para se sentir belas que as mulheres se esforçam tanto em se embelezar. O tratamento que vc recebe em qq lugar é muuuito diferente. Vc não sentiu isso?
    Bjs,
    Anália

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  4. E receber tratamento diferenciado por estar embelezada é discriminação. 'Velha questão'. O paradigma:
    - Altos, belos, sarados = pessoas incríveis
    - todos os demais que não se encaixam no perfil anterior = pessoas relaxadas, descuidadas, desalmadas, etc, etc, etc.
    É difícil, eu sei.

    "Na dimensão humana, ser é ver. Aquilo que vemos está profundamente interligado com o que somos. (...)Os paradigmas são poderosos, pois criam as lentes pelas quais vemos o mundo. A força de uma mudança de paradigma impulsiona os saltos qualitativos (...)." S. R. Covey, de um livro que comecei a ler.

    Lentes cruéis.

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  5. Concordo, Lud. Acho que qdo não estamos preocupadas com tudo akilo q a mídia misógina diz q precisamos nos preocupar(aparência em mínimos detalhes e atitudes específicas em todas as situações) temos mais "espaço livre" pra pensar coisas úteis. Ou inúteis, q seja, mas q nos façam felizes! Do tipo, ao invés de pensar "preciso exterminar o pneuzinho", podemos pensar "quero aprender russo" ou "vou olhar as nuvens até achar uma com forma de dinossauro", sabe?? É MUITA vigilância em torno das mulheres...todo mundo AXA q nosso dono, menos nós mesmas!
    Fiquei besta de ver como meu humor e pensamentos melhoraram dps q eu parei de pensar em silicone, depilação, conduta machista socialmente aceitável. É mto bom!! =)

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  6. Então, olha só, eu concordo em quase tudo.

    Sobre aparência, acho que há um tremendo exagero e uma cultura machista que faz com que mulheres se sintam feias se não gastarem rios de dinheiro. Fecho com isso, sem dúvida. Mas acho que pensar na própria aparência, sem neuras, pode ser um prazer saudável e inofensivo, que não tolhe ninguém.

    Acho realmente que aparência envolve mais coisas que julgamento status e a maneira que a gente se apresenta ao mundo diz muito sobre a gente mesmo, mas que podemos subverter os parâmetros estabelecidos se quisermos. Pra mim moda, além da futilidade, é um exercício antropológico. Hoje talvez não fique tão claro, mas o lance de Chanel ter criado uma moda para as mulheres serem mais livres e abolindo o espartilho não é só uma historinha num filme.

    E ó, eu tenho uma super necessidade de ócio não reflexivo. Tipo site de celebridades mesmo. Não acho o que está lá importante, mas às vezes quero esvaziar a mente. No fundo, nunca escapo de alguma reflexão sobre tudo o que vejo (tô a séculos pra escrever um post sobre o machismo do Manuel Carlos, que é ultrajante). Teoricamente, no tempo em que estou vendo alguma futilidade, poderia estar usando minha cabeça pra algo produtivo. Mas às vezes, esvaziar a cabeça é o que de mais produtivo posso fazer por mim no momento.

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  7. Oi, Lud

    Eu acho que uma coisa não necessariamente exclui a outra. Eu posso dar bola para a minha aparência sem julgar aquele ou aquela que não o faz, é uma questão de exercício de relacionamento. Eu posso selecionar, dentro do bombardeio de necessidades inventadas, aqueles produtos ou aquelas práticas que me dão prazer ou que me servem de alguma outra maneira, sem necessariamente me deixar escravizar por elas. Coisas do tipo: eu, fulana, me sinto melhor de cabelo assim ou assado; o cabelo assim ou assado dá mais trabalho de manter; eu me disponho a fazê-lo porque o acho bonito, ainda que ele esteja absolutamente fora da moda vigente nesse verão/mês/século. Nesse exemplinho hipotético a fulana não é escrava da moda, mas alimenta sua vaidade com o cabelo. Enquanto isso, gerencia uma empresa de jornalismo alternativo que combate a mídia emburrecedora, por exemplo. Perfeitamente factível.

    Outro dia falei no meu blog sobre a Clarice Lispector (que tinha um olhar ímpar sobre a tal "condição feminina" em nossa sociedade) que escreveu sobre regras de etiqueta... Ou seja, acredito que cabe tudo, desde que com equilíbrio. Até acho que rola uma certa tendência meio natural de nos desvencilharmos de certos padrões à medida que refletimos sobre toda a manipulação e o machismo e tal; mas não necessariamente desperdiçamos todo nosso potencial pensante quando pintamos as unhas. Mas que esse papo vai longe, ah vai.

    Beijo!
    Rita

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  8. Outra coisinha:

    Hoje, saindo do salão onde cortei o cabelo, hohoho, vi uma mulher carregando uma bolsa enoooooooorme (na verdade, pouco maior que a minha, ó céus). E aí fiquei pensando: putz! isso dá um ótimo post la no blog da Lud! O Caso da Bolsa!! Claro: já parou pra pensar no porquê de grande parte da mulherada "precisar" carregar tanta tralha pra lá e pra cá, enquanto os homens fazem o mesmo vai e vem com uma mísera carteira no bolso? Hum? Hein? What do you think? Bom, em minah defesa prévia: eu tinha um livro na minha. Mas essa desculpa não vale, porque mesmo quando o livro não está lá, ela vai comigo.. defesa fraca. Sorry.

    ;-)
    Rita

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  9. Rita, assim como cabelo, o assunto 'bolsa, o carma que você carrega' também rende muito. Acho que a Lud já escreveu algo sobre isso, não? Foi aqui: http://ludmilismos.blogspot.com/2009/11/o-caso-da-bolsa.html .

    Eu fiz uma experiência depois que li. Em uma necessaire (20x13x8cm, mais precisamente) coloquei tudo o que eu preciso durante o dia, pra trabalhar, e agora, pra estudar. Chaves, desodorante, escova e pasta de dente, um creme pra mãos sofridas em papéis, óculos, protetor solar para albinas, um batom. Não foi necessário quase mais nada. Ah, e um livro. O restante é material de faculdade, e isso não conta, não é? Afinal, a gente não precisa mais de 12 cores de canetas-gel para sublinhas títulos. ;)

    E que tal uma bolsa-carteiro, deixando mãos livres, que te lembram que se exagerar no peso, a coluna sofre?

    Eu simplifiquei, e adorei.

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  10. Oi, Desabafando! Obrigada! Vou ler o post que eu, atrasilda, não tinha visto. Valeu!

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  11. Oi, Rita!
    As mulheres usam bolsas grandes e os homens não justamente porque pedem para a gente carregar tudo na nossa bolsa, rsrsrs!
    Bjs,
    Anália

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  12. Olá Lud, apesar de eu não usar maquiagem, nem salto, nem fazer unhas, nem cortar as cutículas etc vou saltar na defesa das pessoas* "vaidosas" digamos assim (não que eu não veja vaidosa na minha maneira): nada impede que alguém use maquiagem E canalize suas energias para outras atividades mais produtivas. Quem vê cara maquiada não vê coração :)

    Vc escreveu desconfiar que muito poder cerebral é canalizado para atividades pouco construtivas e nada revolucionárias. Pois é, eu sirvo de exemplo. Meu passatempo preferido é andar de bicicleta. Podia usar a onda ecológica para argumentar que estou salvando o planeta e com isso quem sabe me sentir revolucionária (e superior aos motoristas-poluidores), mas estaria mentindo. Mesmo quando uso a bici como transporte, pedalar pra mim é uma grande diversão.

    *Inicialmente escrevi "mulheres" mas substitui por "pessoas" já que conheço vários homens vaidosos. Meu melhor amigO é 20x mais preocupado com apresentação pessoal que eu.

    Eu nunca tinha escrito tanto num comentário, esse assunto rende :)

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  13. ops, onde escrevi "veja vaidosa" leia-se "seja vaidosa".

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  14. Oi, Analia! Hehehe, é dose, viu... A gente tem de passar a bola pra eles então, certo? "Carrega minha bolsa, por favor?". Putz, aí vão nos chamar de dondoca! Viver é difícil. ;-)

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  15. Lud, só agora vi e respondi seus comentários (shame on me).
    Retirei a moderação, quem sabe agora aprendo a mexer no blogger.

    beijo

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  16. Viajei pra BH e enquanto isso o assunto rendeu! Que bom.

    Barbara,
    pra completar, "obsessão em consumo" e "mulher" é uma duplinha bem popular, né? Porque "toda mulher adora comprar" ou "toda mulher ama sapatos".

    Ale,
    eu também acho. Ou então que a diversão desmiolada seja pelo menos inofensiva. Que não fique incentivando consumo, culto à aparência, competição.

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  17. Anália,
    faço minhas as palavras da Ada (comentário seguinte).

    Mas, pragmaticamente, "estar embelezada" para ser bem-tratada tem de ser estar maquiada, unha feita, salto alto e cabelo escovado? Ou dá para ter uma aparência "aceitável" de calça social comprida, sapato baixo e cabelo curto? Eu acho que dá.

    Ao fim e ao cabo, quem perde são os "maltratadores" (a gente só passa um pouco de raiva). Tenho uma amiga que ganha muito bem e nem por isso usa bolsa de marca ou chega nas lojas batendo a mão na mesa e exigindo atenção imediata. E quando ela decide comprar, ela compras sem dó. Ontem também conheci um cara que anda vestido com a maior simplicidade e, conforme a arquiteta dele, tem muita bala na agulha. E quando ele vai a uma loja e o povo não dá atenção, ele vai embora e pronto. E a loja perde uma venda de muitos milhares de reais em acabamentos.

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  18. Ada,
    faço minhas as suas palavras (2). E conta que livro é esse que você tá lendo!

    Flavia,
    não é? Não é? O meu humor também melhorou e, quando parei de me preocupar tanto com a minha aparência, fiquei mais auto-confiante. Tá, revista Nova? Não fui implante de silicone nem tingir o cabelo de louro. Foi entender que não tô nesta vida para decorar o ambiente.

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  19. Iara,
    concordo em mil coisas. Acho que a moda pode ser usada para transgredir, sim (penso nos punks). E sou uma sincera admiradora da Chanel: a bolsa 2.55 que eu queria adquirir tem todo um significado - ela colocou corrente como alça para as mulheres ficarem com as mãos livres.

    Mas quando vejo praticamente todos os estilistas europeus atuais dizendo que seu objetivo é uma mulher sexy eu fico brava (Chanel criava muitas roupas elegantes, práticas e não-sexy, por sinal).

    O que me incomoda na moda não é ser exercício de futilidade. Por sinal, eu sou muito a favor do ócio não-reflexivo. O que eu acho problemático é que a moda, hoje, e os programas de celebridade (que eu já vi de monte!) e os blogues de maquiagem NÃO são uma futilidade inofensiva. Eles reforçam o papel da mulher como enfeite, o consumismo, a importância da aparência etc. etc., sabe? Eu acho.

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  20. Rita,
    eu não desprezo quem faz as unhas ou cuida do cabelo (rsrs). Puxa, era eu, ontem. O que acontece é que, dentro de todo um contexto da situação da mulher na sociedade, comecei a achar que não é vantagem, sabe? Imagine que eu esteja estudando para o vestibular. O meu concorrente masculino vai ganhar muitas horas de estudo ou descanso enquanto eu faço unha, hidrato o cabelo e/ou me preocupo com os quilos que estou ganhando porque larguei a academia. Então estou achando que a tal vaidade é um handicap. Mas essa sou eu, claro.

    Ah, a bolsa! É mais uma situação na qual os homens levam vantagem, e mais um foco de consumismo feminino. Eu ainda não consegui me livrar da minha, mas estou trabalhando nisso!

    Ada,
    não é mesmo prático se livrar dos excessos que a gente carrega?
    Eu adoooro bolsa-carteiro. Tenho uma que levo toda vez que viajo (não é tão grande e libera as mãos. Ela tem mais de 10 anos de idade, e já passeou no sapateiro, para renovar a tintura, mais de uma vez). E a irmã I. acaba de me presentear com uma míni-bolsa carteiro que é tudibom.

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  21. Dri,
    mas andar de bicicleta não reforça estereótipos femininos pouco saudáveis, sabe?
    O seu amigo vaidoso tem a opção de ser vaidoso ou não. Muitas mulheres não têm (até porque nem passa pela cabeça delas que essa opção existe).
    Claro que existem pessoas vaidosas E inteligentes. Eu era uma delas =D.

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