domingo, 25 de abril de 2021

O fetiche do lugar

Sim, eu tenho certeza de que, quando eu morar em determinada cidade/país, serei completamente feliz. 

Essa certeza é fundada na razão? De jeito nenhum. Isso faz que eu a abandone? Também não. 

O grande problema é que, se fosse verdade, todos os habitantes de determinada cidade/país seriam perfeitamente felizes - e a gente sabe muito bem que não são. 

Fico pensando que o fato de ter nascido e morar em determinada cidade/país nos faz achar tudo muito normal e ver muito mais os defeitos do que as qualidades. Eu, por exemplo, ando bem desiludida com o Brasil. Por outro lado, há um sem número de estrangeiros que sonham em se mudar para lá. Um amigo europeu da minha irmã já perguntou o que ela foi fazer na Alemanha, uma vez que aquela terra é cheia de regras e que o Brasil é muito mais legal. Além disso, muitos colegas moraram ou moram em lugares/países considerados espetaculares e nem por isso estão realizados como pessoas. 

Depois de muito quebrar a cabeça com esse dilema (e partindo do pressuposto que estou certa e que morar em determinada cidade/país me fará completamente feliz), concluí que tudo depende do que se espera de determinada cidade/país. 

Quem quer família e um grande círculo de amigos próximo e for para muito longe vai ter dificuldades, sim. E quem se muda para outra cultura talvez leve muito tempo para se sentir à vontade. Fora isso, quanto mais a pessoa se conhecer, mais terá de chance de acertar: não adianta adorar carnaval e calor e se mudar para os países nórdicos. 

Já minhas ambições são razoavelmente modestas: quero morar em uma cidade segura e bonita, com uma boa rede de transporte público. Se for histórica, melhor ainda. Estou acostumada com a família longe e com os amigos espalhados. Tendo Leo e Kindle (e umas bibliotecas públicas não caem mal), estou satisfeita. 

(Ah, e já ia esquecendo: temperatura agradável para caminhar. Pode ser frio, porque diante do frio a gente consegue se agasalhar, mas do calor só nos resta sofrer.)

Manila é bem legal, mas as altas temperaturas e a umidade dificultam os passeios ao ar livre. E tem a pandemia, né? Nem é justo avaliar uma cidade nessas condições. 

E por que estou pensando sobre o assunto? Porque o próximo posto (no fim de 2021? No meio de 2022? Ninguém sabe ainda) será, esperamos, uma cidade europeia, em um mundo pós-pandemia. Aí sim, serei perfeitamente feliz. 

quinta-feira, 22 de abril de 2021

O vício

O Leo me convenceu a fazer uma lista dos livros que leio. Não ligo para produtividade nesse quesito, porque leio para me divertir (e refletir, e aprender), mas achei a ideia boa, principalmente para lembrar em que época eu estava explorando um ou outro assunto. 

Ontem estava atualizando a lista me bateu a curiosidade de checar quantos livros li em 2020. Para minha surpresa, foram muitos menos do que em 2019 (25%, para ser exata).  Achei esquisito. Em tese, na pandemia, não tive mais tempo para ler?

Não necessariamente: em abril de 2020, quando lockdowns e quarentenas ainda eram uma novidade, descobri o Twitter e os portais de notícia. Pronto, passei a gastar uma quantidade incrível de tempo na internet, naquela ilusão de que estava fazendo alguma coisa, mas na verdade só me frustrando com o que acontecia no mundo e, principalmente, no Brasil. Claro que foi muito importante me informar sobre a Covid-19 e tomar os devidos cuidados, mas isso não leva mais do que alguns minutos por dia. 

Então, mais uma vez, me despedirei do sugadouro das mídias sociais e tentarei usar meu tempo de maneiras mais agradáveis e estimulantes. Um cochilinho, por exemplo, sempre cai bem. 

quinta-feira, 15 de abril de 2021

Vai passar, mas não passa

Nos últimos dias bateu a bad: todos os indícios sinalizam que não vamos poder mudar de posto tão cedo. Por tão cedo, entenda-se... este ano. Talvez só vá rolar no meio de 2022. 

Até então, vínhamos vivendo como se a pandemia fosse acabar loguinho. Quando essa esperança acabou, nos agarramos à perspectiva morar em outro país, que estivesse mais avançado na vacinação e/ou cujos hospitais não estivessem sobrecarregados. Agora, essa esperança também definhou. 

O jeito, se é que tem jeito, é parar de viver como se a pandemia fosse acabar loguinho (pensando só no futuro, afogando as mágoas no chocolate e no vinho) e começar a viver com o que temos para hoje. 

Como, exatamente, ainda não sei. 

* * * 

E hoje meu chefe foi vacinado aqui em Manila, o que me encheu de alegria e esperança. Tudo bem que ele é da categoria seniores e que não vamos ser chamados semana que vem para nossa primeira dose, mas olha, está acontecendo. 

Tem outra: como gostamos muito de caminhar, mas aqui está difícil - não só por causa da quarentena, mas também por causa do calor, umidade, trânsito, barulho e poluição -, compramos uma esteira. Foi o jeito de "pensar fora da caixa": jogar dinheiro no problema.  

Sim, vou botar um vídeo de paisagem na tevê e caminhar olhando para a tela, tentando me convencer que estou passeando. Se meu cérebro for enganado em uns 20%, tá bom. 

sábado, 3 de abril de 2021

Saia ou short

 Uma vez, quando éramos ambos crianças, um primo me perguntou:

"Você prefere ser menina ou menino?"

Nem pisquei para responder:

"Prefiro ser menina. Porque eu posso usar saia e short, e você só pode usar short."

Fui bastante literal, mas hoje eu vejo toda uma sabedoria nessa resposta. O que eu estava dizendo, e isso vale até hoje, é a mulheres podem experimentar um número muito maior de vivências do que os homens. 

Não que ser mulher não tenha seus problemas. Ô, se tem. Mas, enquanto as mulheres, aos trancos e barrancos, foram ocupando (ainda que devagar, ainda que minimamente) praticamente todas as áreas consideradas masculinas, o contrário praticamente não ocorreu. A razão me parece óbvia: o campo "feminino" (cuidar, educar, alimentar, gerenciar emoções) é considerado menos importante. Causa e consequência desse fato: são atividades não remuneradas. 

(Obs: a OIT calcula que o trabalho de cuidado não-assalariado corresponde a 10 trilhões de dólares por ano, ou 13% do PIB mundial.)

Hoje as mulheres podem usar calças. Por que os homens não podem usar saia?